Ser corretora de imóveis de alto padrão é, muitas vezes, escutar mais com o coração do que com os ouvidos. Ao longo dos anos, já acompanhei famílias que se emocionam ao entrar em uma casa pela primeira vez — não pelos acabamentos modernos ou pelo projeto assinado, mas porque, de alguma forma, aquele lugar falava com elas. Em contrapartida, vejo com frequência imóveis impecáveis no papel, aclamados por todos como verdadeiros símbolos de status e sofisticação, mas que, na prática, causam um incômodo sutil, difícil até de explicar. Não é raro que essa sensação venha da distância entre o que foi projetado como “luxo” e o que realmente representa conforto, identidade e pertencimento.
As tendências, os lançamentos e o consumo têm poder de persuasão. Somos bombardeados diariamente com imagens de ambientes perfeitos, minimalistas, neutros, simétricos e silenciosos. Casas que mais parecem editoriais de revista do que lares de verdade. É bonito, claro. Mas bonito para quem? Sofás brancos que causam pavor nas mães de crianças pequenas. Tapetes claros que viram campo de guerra com um cachorro em casa. Cozinhas frias, projetadas para impressionar — mas pouco acolhedoras para uma boa conversa no final do dia. E é nesse ponto que nasce a grande armadilha: transformar a casa no reflexo do mercado e não da nossa essência.
Vejo com frequência um certo cansaço nos olhos de quem procura um novo lar, como se estivessem tentando encontrar um lugar onde coubessem, mas sem abrir mão daquilo que deveria ser considerado de bom gosto. Há uma ilusão comum de que luxo é aquilo que está em alta — a cor do ano, o material da vez, a disposição “instagramável”. Mas luxo mesmo, para mim, é poder caminhar descalça na casa onde você pode rir sem medo de manchar o piso. É se jogar no sofá com seu filho sem pensar se a almofada vai amassar. É saber que a beleza do espaço está na energia que ele carrega e não no que está na vitrine.
Não estou dizendo que a personalização é um erro — pelo contrário, ela é essencial. Mas quando ela ultrapassa a linha da identidade e passa a obedecer somente ao que os outros querem ver, perdemos o ponto. É como vestir uma roupa linda, mas que não te serve. Existe um desconforto sutil, constante, que não se explica. E a casa, que deveria ser o lugar mais íntimo e libertador, vira palco de um personagem. Um personagem cansado, muitas vezes.
Já entrei em imóveis de altíssimo padrão, com automação total, mármore importado e luminotécnica impecável — mas que soavam frios, impessoais, silenciosos até demais. Ao mesmo tempo, já acompanhei visitas em casas menos “glamourosas” no olhar técnico, mas repletas de vida: quadros pintados pelos filhos na parede, uma manta jogada no sofá, aromas de bolo saindo da cozinha. E o mais curioso? Nesses últimos, quase sempre ouço: “Aqui eu me sinto em casa.”
Há um romantismo em torno do imóvel ideal, e ele precisa ser desconstruído. A perfeição arquitetônica sem vida real não sustenta o tempo. O que sustenta é a memória construída, o conforto emocional, a conexão com o espaço. Não é à toa que, muitas vezes, imóveis de alto padrão recém-entregues demoram a ser vendidos. Faltam alma, calor, presença. Faltam marcas humanas. E isso, ninguém projeta em planta.
Luxo é viver com verdade
Chega um momento em que as famílias começam a perceber que o verdadeiro luxo é muito mais interno do que externo. É quando a pergunta muda: “Qual a metragem?” dá lugar a “Como nos sentimos aqui?”. É nessa mudança de foco que nascem as decisões mais acertadas, mais duradouras. E é nesse momento que minha função como corretora de imóveis de luxo deixa de ser apenas técnica — ela se torna, antes de tudo, escuta. Porque vender um imóvel de alto padrão não é empurrar um padrão. É encontrar a identidade da família dentro das possibilidades que o mercado oferece.
O conceito de bem-estar mudou. Antes, ele vinha da estética. Hoje, ele vem da funcionalidade afetiva. Claro que os acabamentos importam, os detalhes contam. Mas luxo de verdade é aquele que sustenta a rotina, que se adapta ao improviso, que respeita as individualidades. E isso inclui, sim, a bagunça das crianças, os brinquedos espalhados, a louça que sobra da janta, o canto improvisado para trabalhar de chinelo. A casa feliz tem barulho, tem movimento. E o verdadeiro luxo é saber que tudo isso pode existir com elegância.
Por isso, ao pensar em comprar ou vender um imóvel de alto padrão, é preciso mais do que olhar com os olhos. É preciso olhar com a alma. É importante refletir se o que está sendo oferecido ou adquirido tem valor agregado ou só aparência agregada. Porque de nada adianta um design de interiores premiado, se quem vive ali anda pisando em silêncio, com receio de desalinhar o tapete. Imóvel de alto padrão de verdade é aquele que comporta a sua melhor versão, e não uma versão fabricada para os outros verem.
E vale um alerta: esse tipo de reflexão exige coragem. Coragem para não seguir o que está em alta, coragem para assumir o que realmente faz sentido para sua rotina, sua história, seu coração. Às vezes, o imóvel mais valioso não é o mais caro, mas o mais verdadeiro. O que permite autenticidade, acolhimento, liberdade. O que tem cheiro de café na cozinha e som de risadas nos corredores. O que guarda silêncios confortáveis e não a pressão do que “deveria ser”.
Também é preciso considerar, com muito carinho, o valor da manutenção da casa real. O que se mostra limpo, cuidado, em bom estado, reflete também o que está sendo construído emocionalmente ali dentro. Não adianta desejar uma casa feliz se ela já demonstra abandono nos pequenos sinais: um jardim maltratado, um móvel quebrado, uma limpeza negligenciada. Luxo, acima de tudo, exige zelo. Não só por estética, mas por respeito ao próprio investimento e às histórias que ali são vividas.
Em um mercado onde tudo muda tão rápido, ser verdadeiro virou um ato de resistência. Mas é também um ato de grandeza. A verdadeira sofisticação está na capacidade de olhar para o imóvel e dizer: “Isso me representa”. Seja com cores sóbrias ou com paredes desenhadas por crianças. Com mármore italiano ou com piso quente e aconchegante. O importante é que aquilo tudo tenha alma. Que seja seu.
Meu papel como corretora de imóveis de luxo em Chapecó é, sim, garantir que cada detalhe esteja à altura do investimento. Mas meu compromisso maior é com a verdade. Porque acredito, com toda a minha experiência, que o imóvel ideal não é o mais bonito da vitrine, mas o mais sincero no coração. E quando essa conexão acontece, não há tendência no mundo que tenha mais valor.